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Nota de Repúdio: Sociologia e Filosofia (IFRJ)

NOTA DE REPÚDIO, Maio de 2019!

Nós, professores de Filosofia e Sociologia do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), manifestamos nosso repúdio às recentes declarações do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Educação Abraham Weintraub que, novamente, atacam as Ciências Humanas, em especial a Filosofia e a Sociologia. As declarações estão baseadas em argumentos falaciosos e ferem o princípio da autonomia universitária, previsto no artigo 207 da Constituição Brasileira, que confere às universidades a “autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial”.

Além disso, a diminuição do orçamento nessas áreas não se justifica economicamente, uma vez que o montante seria irrisório. Apenas para citarmos um exemplo, as áreas de Ciências Sociais e Filosofia representam somente 1,4% e 0,7%, respectivamente, dos gastos com bolsas concedidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Mas o equívoco (ou a má fé) não é somente de ordem econômica, mas também de ordem política. Por um lado, busca-se restringir a todo custo a potência do pensamento, da crítica, da abertura para outros mundos possíveis e do questionamento do status quo, uma vez que uma população esclarecida tem maior capacidade de análise, argumentação e decisão e dificilmente é seduzida por discursos sem fundamento, que apostam na ignorância. Por outro lado, o ministro da educação já deixou bem claro, por exemplo, que um filho de agricultor tem que estudar áreas como Veterinária, e não Ciências Humanas, pretendendo determinar o que os indivíduos vão fazer com suas vidas a partir de uma lógica pré-moderna, em que as pessoas tinham suas trajetórias marcadas pela fatalidade de seu nascimento, cultura, tradição e classe.

As declarações revelam ainda uma profunda ignorância sobre o processo de formação básica e profissional bem como sobre a natureza dos conhecimentos produzidos pela Sociologia e Filosofia. Uma formação de qualidade passa, necessariamente, pelo conhecimento do mundo à nossa volta, do contexto social, político, econômico e cultural no qual os indivíduos se inserem. A perspectiva sociológica permite a desnaturalização dos fenômenos sociais e, consequentemente, propicia a reflexão crítica sobre a realidade que é construída socialmente e que, portanto, é passível de ser transformada. A Filosofia tem, desde seu nascimento, a força de despertar o espanto com aquilo que já se cristalizou com as vestes da normalidade, tem a potência da busca por fundamento lógico daquilo que se diz e do que se faz, e carrega a exigência da autonomia e da plena liberdade do pensamento para que os indivíduos sejam capazes de determinar seus próprios caminhos e o tipo de sociedade em que consideram mais justo viver.

Na formação técnica e profissional, a Sociologia e a Filosofia têm um papel fundamental: contribuir para a formação de profissionais capazes de compreender o contexto no qual atuam; de avaliar as implicações éticas e políticas daquilo que se desenvolve enquanto ciência e inovação; de compreender que a dignidade da vida humana está na capacidade de agir e intervir na história e de que não há formação de trabalhadores sem criação da capacidade de exercer cidadania consciente e crítica.

Educar é questionar e repensar valores, sistemas e agendas políticas, tradições, projetos de futuro e modelos de sociedade. O contrário disso é adestramento, e não educação. Por isso, a Filosofia e a Sociologia são fundamentais para que a educação possa de fato existir, para que as ciências exatas e biológicas tenham um sentido ético e para que nossa sociedade se torne mais reflexiva, justa e diversa.

Professores de Sociologia e Filosofia do IFRJ

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